UM TALENTO ESPECIAL

Zé Naldo era uma figura muito querida por todos. Há uma lenda que fala que ele podia mudar as coisas ao seu redor. Tudo o que ele tocava, melhorava consideravelmente e se transformava em algo sensacional. Uma tapera era um castelo, um boteco, um bar refinado, uma canção acompanhada por um violão, um evento musical, e assim por diante. A simples companhia de Zé Naldo era memorável. O que acontecia naqueles momentos, virava assunto para papos intermináveis. O seu castelo, uma simples tapera na praia de Blujabu, era um local, apesar da simplicidade, muito frequentado por aqueles que apreciavam as coisa boas da vida. Ali aconteciam episódios que misturavam realidade e fantasia, partindo da ideia de que um lugar simples se transformava no que havia de melhor. A tapera, admitida por todos como um castelo, era construída de madeira com suas paredes preenchidas com palha de coqueiro e até papelão. O rico mobiliário eram troncos de coqueiro e as acomodações eram em tapetes de sisal, que se tornavam camas confortáveis para quem ali descansava depois de uma boa farra. Dentro da mística de Zé Naldo, contava-se, o seu poder peculiar de transformar a realidade a sua volta. Com a presença dele tudo ficava diferente, com a vantagem de tudo parecer melhor do que realmente era. Conta-se uma estória, que na sua tenra juventude, ele se aventurou na arte da encenação, participando de uma peça teatral apresentada no maior teatro da cidade, havendo uma grande repercussão na época. O grupo de teatro no qual Zé Naldo era componente se chamava de Teatraldo, certamente em sua homenagem. A peça o tinha como ator principal e versava sobre os conflitos da burguesia em meio a tanta probreza. A personagem principal era chamada de Zé Rico, que passou, de repente, a apresentar muita pena dos seus irmãos desvalidos, e, a partir daí, começou um processo de distribuição da sua riqueza a instituições de caridade. As outras personagens: mulher, filhos e funcionários, ficaram contra a vontade de Zé Rico e o internaram num asilo para loucos. No desenrolar do espetáculo, a família sem Zé Rico não soube administrar os seus bens e foi a falência. No final da peça Zé Rico volta ao convívio familiar e recupera a fortuna da família, só que dessa vez, ajudando aos necessitados. No fim da peça, a plateia aplaudiu de pé, a crítica apontou a excelente qualidade do enredo, o desempenho dos atores e o cenário espetacular. Os jornais locais comentaram sobre a grandiosidade da peça, tudo era maravilhoso, destacavam. Aquela peça foi realmente um marco no teatro da cidade. Para a surpresa de todos, inclusive, do jovem Lamare, ator da companhia Teatral, que até hoje conta essa passagem, Zé Naldo deixou o teatro, apesar de todo o seu sucesso como ator. Ele explicava que não tinha vocação para a arte da encenação. Aquela participação foi uma invenção do amigo Lamare. Curiosamente, alguns anos depois, a peça foi novamente montada, só que daquela vez com um elenco diferente. As apresentações da mesma peça bem sucedida não repetiram o sucesso passado. Os jornais destacaram um espetáculo fraco em todos os aspectos, principalmente, consideraram o texto medíocre, além de um cenário e figurino que deixaram a desejar. Nesse novo cenário, Lamare apelou para Zé Naldo assumir o papel principal, o papel do Zé Rico na peça. Este aceitou o convite com a condição de participar de poucas apresentações. A primeira performance aconteceu com uma plateia pequena a assistir ao show. No entanto, a apresentação foi um sucesso total, todos os presentes gostaram da peça e saíram satisfeitos com o que viram. Um Jornal local comentou que Zé Naldo deu um brilho especial àquela peça. A passagem de Zé Naldo pelo teatro se tornou uma de suas estórias preferidas e foi contada por toda a sua vida. Esse talento especial de Zé Naldo o acompanhou por toda a vida, não se sabe ao certo se ele tinha consciência deste dom, mas, sempre, tudo a sua volta foi pleno de encantamento, beleza e alegria. Ele foi uma figura rara que viveu feliz e trouxe a felicidade para muitos, como, até hoje se conta por quem o conheceu.