PRAIA DA PONTINHA

Ontem encontrei o velho amigo Castilho e perguntei-lhe sobre a Praia da Pontinha. Ele me respondeu que tudo está como antes, sem novidades, e, mais, com o agravante da sua população estar diminuindo. Eu, ainda, questionei se a nova ponte atravessando o Rio Grande, da cidade à Praia da Pontinha, havia mudado alguma coisa. Ele insistiu em dizer que o marasmo ali é maior a cada dia. É realmente surpreendente que aquele local seja esquecido, mesmo possuindo belezas naturais e pontos históricos como a Igreja de Pedras e o Pontinha Club, ambas as construções feitas com a pedra preta de inigualável singeleza. Cita-se, ainda, o Rio Grande com suas águas azuis e calmas a encontrar-se com o Oceano Atlântico, formando uma barra realçada pelo forte de cinco pontas a vigiar a entrada de invasores em tão cobiçado território de ilusões. Pode-se daquela praia vislumbrar a silhueta da cidade riscada por construções que dão ao visitante uma vista fenomenal. Também, assiste-se aos navios navegando pelo Rio Grande e se juntando ao Porto da Cidade, conferindo um aspecto pitoresco àquela paisagem. Mas, nada disso atrai novos moradores, e, os visitantes passam direto para outros locais, como se não percebessem a bela praia. Castilho salientou que a areia branca estava tomando conta das ruas deixando o vilarejo como ele foi há décadas atrás, como apresentado numa velha aquarela do genial artista Marinho. Quis, também, saber de notícias dos velhos moradores e veranistas. Com tristeza soube que a maioria deles se encantou, mas as suas casas estão conservadas por seus descendentes. O conhecido casarão da Banda Flamenca se encontra abandonado, sendo hoje frequentado apenas por fantasmas de boêmios, intelectuais e festeiros que se reuniam em festas que duravam dias, ao som das marchas de carnaval e da boa música popular. Os flamencos, como se intitulavam os foliões, estão ancorados na dimensão atemporal das memórias dos que por ali passaram e aproveitaram tão prodigiosa alegria de viver. O poeta João Adrigi, de vez em quando, vai até lá levando seu violão sem cordas, e, anima uma festa imaginária animada pelas lembranças vivas no universo onírico de sonhadores como ele. O bar Pé do Carcara se mantém vivo com seu dono João a insistir em manter o estabelecimento aberto aos sobreviventes que ali visitam bons tempos regados a cerveja, cachaça, vinho e tira gostos espetaculares. Na inauguração da Ponte estiveram presentes autoridades que lembraram os antigos veranistas e admiradores de tão belo local. Foi relembrada a travessia nos barcos a vela e nas lanchas que flutuavam no Rio Grande, saindo da dura cidade em direção ao aconchego de um lugar repleto de encantos, gastronomia e riqueza humana. Foi ressaltada, nos discursos de inauguração, a profusão dos tipos humanos daquela praia, havia aventureiros, poetas e sonhadores da maior qualidade a exalar o que a vida tinha de melhor. Assim, foi rememorada a poesia de Navarro, a imaginação profícua de J. Bolão, as estórias de Seu Neto contando sua vida como político de esquerda nos sertões, a sinuca jogada primorosamente por Dedete, e, a tapioca deliciosa com peixe frito de Dona Dalila. A fita foi cortada pelo representante do Governador, o também veranista Guga Massaranduba, que citou os seus ancestrais veranistas e suas estórias de amor e respeito por aquele local. Visitar a Praia da Pontinha é recordar o passado e reviver tempos felizes ao lado de imortais presentes na densa bruma de nostalgia inata aos locais de intensa felicidade. Posso enxergar entre as espumas do mar meus ancestrais se banhando no Rio Grande e aproveitando a eternidade num local tão belo e aprazível, cheio de calor, luz e magia. A Praia da Pontinha é um recanto surreal assentada nas minhas lembranças e derramadas numa pintura à óleo, onde se deslumbra um cenário fantástico num lugar parado no tempo, encantado por um rio que abraça o mar num desenho de sonhos, composto por uma bela praia, redes de pesca penduradas ao relento, um mar e dunas brancas.