O CEMITÉRIO DOS INGLESES

No início do século XX, nestas paragens do nosso imenso país, havia o cultivo de algodão que era exportado para o mundo inteiro. Dessa forma, instalaram-se nesta cidade escritórios de empresas especializadas na compra e venda daquele produto. As empresas  eram comandadas por estrangeiros de nacionalidades diversas, entre elas ingleses, suíços, belgas e alemães. As suas sedes eram localizadas no bairro antigo da cidade, na Rua Argentina, considerada a mais importante em função da sua riqueza de lojas, restaurantes, escritórios, hotéis, bares, etc. Também, por estar mais perto do Porto, por onde era escoada toda a produção para os países compradores. Esses estrangeiros europeus passaram a viver aqui no clima tropical, e, alguns ficavam doentes e faleciam. Como a sua grande maioria era de religião protestante, passaram a ser sepultados em um cemitério adequado à sua crença. O cemitério local mantinha fortemente tradições católicas com muitas capelas, anjos e santos. O cemitério para os estrangeiros, batizado pela população de cemitério dos Ingleses, foi construído na margem esquerda do Rio Grande sentido Oceano Atlântico. Os túmulos para os estrangeiros naquele cemitério eram feitos contendo uma lápide informando o nome e as datas de nascimento e morte do falecido. Um desses falecidos foi o inglês Jones, que foi sepultado no cemitério dos ingleses que já contava na época com algumas dezenas de covas. O enterro foi feito pelo seu empregado Max, um alemão que já vivia na cidade há algum tempo, inclusive, casado com uma nativa de nome Maria, adepta do candomblé. Alguns dias após o enterro do Sr. Jones, Maria recebeu um recado comunicando que uma entidade do além queria falar com o seu marido. Muito assustado Max foi com Maria ao Terreiro de Candomblé e teve uma comunicação a sós com uma senhora que pareceu encarnar o Sr. Jones dando o recado: apanhe o dinheiro no cofre da empresa e o leve até o meu túmulo. Instrua a minha família a vir buscá-lo o mais rapidamente possível, o segredo do cofre são os números do escritório. Logo depois a senhora voltou ao normal como se nada tivesse acontecido. Maria procurou saber o que tinha se passado mas o marido desconversou e disse que seu ex chefe informou que tudo estava bem. Na mesma semana Max foi ao escritório, olhou os números do prédio e abriu o cofre. Foi uma surpresa fenomenal a abertura do cofre com aqueles números. Um arrepio subiu por toda a sua espinha terminado no pescoço. Eram dólares americanos em grande quantidade. Dinheiro que servia ao negócio de compra e venda de algodão. Max dividiu o dinheiro em duas partes. A metade ficou com ele e a outra foi colocada na cova como combinado. De uma hora para a outra o empregado da empresa ficou rico, comprou uma casa na Cidade Alta com vista para o mar, comprou carros e sua vida mudou. Realizou o sonho da sua mulher de conhecer a Europa fazendo a viagem num luxuoso navio transatlântico. Na Europa visitou o seu País e apresentou sua esposa a sua família. Na volta continuou a vida de muito luxo. A explicação para a súbita riqueza foi uma herança ganha dos seus parentes alemães. A outra metade da fortuna continuava no túmulo do Sr. Jones. O dinheiro de Max estava se acabando, embora ele tivesse construído uma fileira com umas duas dezenas de casas à beira mar na praia da Pontinha, que por sinal, ainda não estavam alugadas. Era hora de buscar o dinheiro no túmulo.  Num dia de lua cheia Max se dirigiu ao cemitério dos ingleses para buscar o restante da fortuna. Sorrateiramente, Max cavou e abriu o caixão e apanhou um saco preto contendo os dólares. Após cobrir a cova com a última pá de terra começou um vento nunca dantes visto. O vento foi de tamanha força que agitou o Rio Grande fazendo com que a suas águas chegassem a beira do cemitério. Max se arrastava com o dinheiro preso a sua barriga até ser levantado pelo vento e foi lançado ao telhado da igreja de pedras.Todo o dinheiro saiu do saco e voou em direção a vila da Praia da Pontinha. O mar se agitou a tal ponto que derrubou todas as casas construídas por Max. No dia seguinte o sol brilhava ferozmente e os moradores tiveram a grande alegria de encontrar dólares espalhados nas ruas do vilarejo da praia da Pontinha. Aquele dinheiro serviu para a reforma de todas as casas que passaram a ser maiores e mais confortáveis. A fileira de casas à beira mar desapareceu da paisagem, o mar levou tudo. Só ficaram algumas fundações até hoje percebidas pelos banhistas. Max acordou com uma forte dor de cabeça e percebeu o que aconteceu. O dinheiro havia desaparecido. Depois soube que a suas casas haviam sido destruídas pelo mar. Nos tempos seguintes Max vendeu tudo o que havia comprado e voltou a sua vida simples e se arrependeu do que fez. Hoje esta estória se transformou numa lenda e existem várias versões para o fato. Uma delas faz do Sr. Jones um benfeitor que ajudou a todos mesmo depois da morte. Dizem que o vilarejo da Pontinha se transformou após esse evento. Suas casas construídas de palha ou de taipa passaram a ser de alvenaria, mudando a vida dos seus moradores para melhor. Dizem que o Sr. Jones visita a Praia da Pontinha nas noites de lua cheia, e já foi visto por muita gente, principalmente, pescadores e boêmios, e se tornou parte da magia daquela bela praia.